E-Book: Palestina – vozes da resistência e memórias de viajantes

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Descrição

O café da manhã tradicional palestino é uma coisa preciosa: hummus (pasta de grão de bico e gergelim), ful (pasta de fava), tomates cozidos, saladas cruas com muita salsinha, azeitonas curadas com limão ou pimenta, o delicioso pão local assado nas pedras, e chá com sálvia (no inverno) ou hortelã (no verão), finalizado com uma pequena xícara de café perfumado com cardamomo. E, foi durante um destes cafés que a ideia de organizar tours políticos na Palestina surgiu.

Eu fui morar na Palestina em 2008 e estava ali há alguns anos, trabalhando como voluntária em um dos campos de refugiados de Belém. Era domingo, e eu estava, como era de costume, nos meus dias de folga no restaurante da cidade vizinha, Beit Jala, onde comíamos embaixo das árvores, admirando o campo de oliveiras que cercava o local. Lembro-me de ter colocado a xícara de café sobre a mesa e declarado que gostaria de compartilhar a Palestina que eu tinha descoberto − a gastronomia, a paisagem, a cultura e a hospitalidade − com as pessoas do Brasil, mas também a luta histórica por autodeterminação e as iniciativas de resistência ao colonialismo. A Palestina do imaginário brasileiro, construída pela mídia hegemônica, povoada unicamente com imagens de “terroristas” e atentados suicidas, estava há anos-luz da realidade. Mas só quem tinha passado por lá sabia, e era exatamente isto que eu queria fazer: levar pessoas até ali para que elas vissem com os seus próprios olhos.

Em 2015 nasceu o projeto de tours políticos veganos na Palestina. A ideia era descobrir a cultura, as paisagens e o movimento de resistência anticolonial, mas também levar solidariedade política às lutadoras palestinas que pagam um preço tão alto por esta resistência. E por que vegano? Porque minha militância é contra todo e qualquer tipo de opressão, incluindo a opressão produzida pela dominação do humano sobre o não humano, que chamamos de luta antiespecista. Não faria sentido guiar um grupo de pessoas pela Palestina, passar dias inteiros sendo testemunha da opressão sofrida por humanos e, ao mesmo tempo, participar da opressão de outro grupo de vulneráveis, os animais, não humanos, a cada vez que sentássemos para comer. Nem todas as pessoas que participaram dos tours eram veganas, mas quem não era concordou em abster-se de apoiar a exploração e a morte de animais não humanos durante a viagem.

Meu papel nesses tours era ser ponte entre as pessoas brasileiras querendo conhecer a luta por autodeterminação do povo palestino e as lutadoras palestinas fazendo este trabalho na base. Por isso, apesar de acompanhar os grupos durante toda a viagem, em cada cidade que visitávamos éramos guiadas por uma pessoa palestina, geralmente alguém da própria cidade. Não fazia sentido que fosse eu, brasileira, a pessoa que explicaria a luta palestina para os grupos. Desde o nascimento da ideia do tour, decidi que o projeto só faria sentido se fosse feito em cooperação com as pessoas palestinas, senão eu cairia em uma armadilha colonial.

Hospedar os grupos na casa de uma família palestina no campo de refugiados onde eu trabalhava também me pareceu um imperativo. Eu não queria que as pessoas participantes dos tours apenas ouvissem histórias sobre a vida sob ocupação militar, queria que elas vivessem, mesmo que por um curto período, o mais próximo possível da realidade das palestinas e dos palestinos nos territórios ocupados.

A escolha de realizar esse projeto, em cooperação com as palestinas, servia a dois propósitos. O primeiro, como já expliquei, seria evitar uma abordagem colonial e paternalista em que uma estrangeira, eu, explicaria a Palestina para outras estrangeiras. A narrativa palestina deveria ser respeitada e compartilhada pelas próprias palestinas. O segundo propósito era acompanhar a nossa solidariedade política de apoio econômico. A economia palestina está sendo estrangulada pela ocupação israelense há décadas e as poucas turistas que se aventuram do lado palestino do muro de anexação construído por Israel visitam apenas Belém, contratando serviços de guias israelenses, dormindo e comendo em estabelecimentos do lado israelense. Muita gente no Brasil compra pacotes de viagens para Terra Santa e volta para casa sem, sequer, saber onde fica a Palestina. Então, apesar de ser uma iniciativa modesta, eu queria que todo o dinheiro gasto pelas participantes durante a viagem fosse diretamente para as pessoas palestinas.

Em cinco anos de tours tive a honra de acompanhar dez grupos de brasileiras e brasileiros em viagens que duraram de oito a quatorze dias. Em 2019, encerrei esse projeto que me trouxe tanta alegria, mas as sementes que ele plantou seguiram brotando. No mesmo ano, Baha Hilo, sociólogo e ativista palestino, nosso guia na região de Belém, fez uma turnê política pelo Brasil, organizada pelas participantes de um dos tours daquele ano.

Durante todo o tempo em que acompanhei brasileiras e brasileiros pela Palestina, eu sonhava em fazer também o contrário: levar palestinas ao Brasil, para que a luta anticolonial deste povo chegasse a mais pessoas. Então, a ida de Baha ao Brasil foi a realização de um sonho antigo e a melhor maneira de encerrar este projeto.

A partir do momento em que tomamos consciência do que está acontecendo na Palestina, compartilhar o que vimos e vivemos por lá torna-se um dever. Este livro é uma tentativa coletiva de cumprir este dever, levar a mensagem de justiça e resistência do povo palestino a mais pessoas e honrar o pedido que tantas vezes a nós foi feito pelas palestinas e palestinos durante os tours: “Quando voltar para o seu país, conte às pessoas de lá o que está acontece

 

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